
Gravação de executivo da Petrobras derrubou dois, delação de quadro da Odebrecht um e tráfico de influências outro. Os que sobram foram citados na Lava-Jato. Como o presidente
A amizade desde o campus da Faculdade de Direito na Universidade de São Paulo nos anos 1960, entre os então estudantes de Direito Michel Temer, atual presidente da República, e José Yunes, assessor especial da presidência e um dos raros membros do executivo com direito a gabinete a seu lado no quarto andar do Palácio do Planalto, foi lembrada e relembrada nos últimos dias: a cabeça de Yunes rolou, após o depoimento de um ex-executivo da construtora Odebrecht que disse aos investigadores da Operação Lava-Jato que usara o seu escritório para entregar 10 milhões de reais cujo destinatário final era Temer. No início eram seis os ministros da quota pessoal do presidente. Sem Yunes, sobram dois e em maus lençóis.
"Não podia permitir que o meu nome fosse jogado no lamaçal", disse o indignado amigo de Temer. "Não quero que a amizade entre os dois seja objeto de exploração, a sua saída foi um gesto de grandeza", acrescentou o presidente. Cláudio Melo Filho, o delator da Odebrecht, assegura que tem provas, como chamadas telefónicas, do que afirma.
Os sobreviventes da tal quota pessoal, Eliseu Padilha, segunda figura do governo na qualidade de ministro da Casa Civil, e Moreira Franco, o secretário de Parcerias e Investimentos e eminência parda do Planalto, também foram citados por Melo Filho. Padilha, por 45 vezes, Franco, por 34. Por isso, no mesmo dia em que Yunes se demitiu circularam informações em Brasília de que Padilha e Franco seguiriam os seus passos, conta o jornal Folha de S. Paulo. O concorrente O Estado de S. Paulo garante que o próprio Temer esteve por 48 horas convencido de que essa seria a melhor opção até ser alertado para o efeito dominó que daí decorreria.
Afinal, se Padilha e Franco se demitissem, mais seis ministros cairiam em seguida por também, sabe o Planalto, estarem em vias de ser citados pelo delator. Pior: soaria estranho que a "limpeza ética" do governo incluísse toda a gente menos o próprio chefe, Michel Temer, nomeado também ele 44 vezes por Melo Filho.
Ao contrário do ministro chefe da Casa Civil e do secretário de Investimentos, que vão sobrevivendo ao terramoto da delação da Odebrecht, outros três "homens do presidente" tombaram ao longo dos sete meses, dos quais apenas três deles definitivos, da gestão de Temer. O primeiro foi Romero Jucá, presidente do Partido do Movimento da Democracia Brasileira (PMDB), a que todos os envolvidos pertencem, apanhado numa gravação com o presidente da Transpetro, subsidiária da Petrobras, a combinar em fevereiro derrubar Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores (PT), "para estancar a sangria da Lava-Jato". Jucá, muito próximo do presidente, demitiu-se mas caiu com suavidade porque foi logo colocado por Temer na estratégica liderança parlamentar do partido no Senado.
Aliás, mesmo fora do governo serviu de porta-voz dele ao afirmar esta semana que "não serão notícias armadas, pressões indevidas ou tentativas de desestabilização que levarão o presidente a fazer mudanças no seu ministério", a propósito de uma suposta remodelação governamental em curso logo após o Natal e as férias de verão do hemisfério sul.
Por outro lado, Henrique Eduardo Alves, protegido de Temer, abandonou a pasta do Turismo na sequência das mesmas gravações. E Geddel Vieira Lima deixou de ser secretário do Governo ao protagonizar o escândalo batizado com o seu nome próprio, em que pediu ao ministro da Cultura que intercedesse a seu favor junto a um órgão público num caso relativo a um imóvel pessoal.
Ao denunciar esse caso, Marcelo Calero, o ministro da Cultura, também se demitiu e Fabiano Silveira, titular da Transparência, caiu noutra circunstância mas Geddel, Alves, Jucá e Yunes é que eram íntimos do presidente, assim como os resistentes Padilha e Franco, todos com história política de dezenas de anos a seu lado. Ao serem atingidos quatro de seis escudeiros de Temer, foi alvejado o coração do governo. E pode ser ainda mais, a qualquer momento: afinal, Melo Filho foi apenas o primeiro dos 77 delatores da Odebrecht a falar.
Em São Paulo
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